Workshop discutiu revisão do Plano Diretor de São Paulo Notícias Observatório

30/05/2023 11:30

O GT Urbanismo, do Observatório de Políticas Públicas (OPP) do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP), realizou no auditório da Escola de Gestão e Contas Públicas do Tribunal, na segunda-feira, 29 de maio, o workshop “A revisão do Plano Diretor”. O evento contou com a participação do arquiteto e urbanista Daniel Montandon, diretor de Arquitetura e Urbanismo e Design na Uninove; do secretário-adjunto da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL), José Armênio de Brito Cruz; do engenheiro civil e pesquisador-colaborador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), Ivan Carlos Maglio; do professor do Instituto das Cidades da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Anderson Kazuo Nakano; e de Sônia Maria Correia Alves, representante do Sindicato dos Servidores da Câmara Municipal e do Município de São Paulo (Sindilex).

O conselheiro coordenador do Observatório de Políticas Públicas (OPP), Maurício Faria, saudou os participantes do encontro e destacou que em sua trajetória, mesmo antes de ingressar no TCMSP, sempre esteve envolvido em questões ligadas ao planejamento urbano, tanto quando vereador como ocupando cargos no Poder Executivo, sobretudo à frente da antiga Empresa Municipal de Urbanização (Emurb). “Por isso, tenho acompanhado com preocupação o processo de revisão do Plano Diretor diante de algumas propostas que surgem com força na Câmara Municipal”, afirmou o conselheiro, lembrando que esta é uma legislação que incide de modo fundamental na modelação do espaço urbano.

Representando o conselheiro João Antonio da Silva Filho, conselheiro dirigente da EGC, a chefe de Gabinete Angélica Fernandes ressaltou a importância do encontro por trazer a possibilidade de discutir um tema tão candente a partir de diferentes pontos de vista. “É preciso pensar em como construir uma cidade na qual as pessoas possam viver da melhor maneira possível, que o desenvolvimento urbano possa ter o ser humano no centro das preocupações”, observou, lembrando que foi colocado agora um projeto substitutivo ao Plano Diretor que vinha sendo discutido na Câmara Municipal.

Como mediadora do debate, a coordenadora do GT Urbanismo, Egle Monteiro, ressaltou que a discussão do tema é dinâmica e exige muita participação da sociedade, ainda mais agora quando um novo projeto substitutivo foi apresentado praticamente às vésperas da conclusão dos trabalhos e da aprovação da revisão do atual Plano Diretor. “Inclusive está se questionando se esse processo seguiu as formalidades legais para sua apreciação, o que é indispensável quando se sabe que a aprovação de um Plano Diretor passa necessariamente por um debate público”, destacou, uma vez que qualquer Plano Diretor se assemelha a um pacto social em torno das diretrizes por ele estabelecidas.

O arquiteto e urbanista Daniel Montandon centrou sua explanação nas quatro principais macroestratégias do Plano Diretor atual e nos resultados obtidos com essas propostas, quais sejam: adensamento das áreas próximas ao transporte público coletivo; transformação de territórios ociosos e subutilizados ao longo dos principais rios e ferrovias por meio de grandes projetos de intervenção urbana, como os Arcos Tietê, Tamanduateí, entre outros; combate à desigualdade, com redução das vulnerabilidades sociais e produção de moradia para quem mais precisa; e, por fim, preservação, proteção e qualificação ambiental e preservação cultural. “Quanto ao projeto substitutivo, ele altera de forma negativa as estratégias do Plano Diretor, pois enfraquece a transformação de territórios estratégicos; flexibiliza as regras de fomento à mobilidade urbana sustentável; explora a lógica de verticalização excessiva; afrouxa o controle e a garantia do interesse público sobre os ativos públicos municipais; e gera menor arrecadação potencial do Fundo de Desenvolvimento Urbano [Fundurb] ao explorar de forma exaustiva o instrumento de Transferência do Direito de Construir”, explicou Montandon.

O secretário-adjunto da SMUL, José Armênio de Brito Cruz, apresentou as diversas etapas que resultaram na proposta de revisão do Plano Diretor encaminhada pelo Poder Executivo municipal à Câmara por meio de projeto-de-lei, afirmando que foi possível fazer um monitoramento do processo público de discussão sobre a revisão, que recebeu milhares de contribuições da população, até tornar pública a proposta que o Executivo enviou ao Legislativo municipal. “Todas as contribuições da sociedade mereceram uma resposta da Prefeitura, e no projeto-de-lei, além das contribuições da população, houve a avaliação técnica e jurídica das propostas pela SMUL, em interlocução com demais setores da administração pública”, ressaltou o secretário-adjunto da SMUL.

Em sua intervenção, Ivan Carlos Maglio, engenheiro civil e pesquisador-colaborador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), classificou o que ocorre hoje com a revisão do Plano Diretor como um “tratoraço urbanístico”. “O substitutivo veio causar a passagem da boiada e o próprio Executivo propôs uma lei para mudar o Fundurb ao mesmo tempo em que manda um projeto de lei para revisar o Plano Diretor e coloca ao mesmo tempo a questão do zoneamento urbano, que estava paralisada desde 2019”, criticou, afirmando que esses fatos denunciam uma bagunça em termos de prioridade. Maglio destacou ainda que considera os eixos de estruturação da transformação urbana um projeto urbano dentro da revisão do Plano Diretor. “A questão que se coloca, e que não está respondida, é se isso vai transformar e criar um impacto na área urbana ou não?”, questionou o pesquisador do IEA-USP, afirmando que isso causa um tremendo impacto ambiental em diversas regiões da cidade. “Mesmo porque hoje foi abolido o estudo de impacto ambiental nas operações urbanas”, advertiu, tratando ainda em sua explanação dos problemas causados pelo adensamento urbano da forma como vem sendo conduzido hoje.

Anderson Kazuo Nakano, professor do Instituto das Cidades da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), atentou para o fato que esta não é uma discussão apenas técnica, mas tem um componente político importante. “A cidade é essencialmente uma entidade sociopolítica, e é importante trazer isso para um primeiro plano, sem desconsiderar os instrumentos e as tecnicalidades de planejamento”, alertou. Para ele, é preciso que nos questionemos sobre que tipo de cidade está se propondo por meio desses instrumentos. “No campo do planejamento urbano temos sempre duas linhas norteadoras: a da cidade como uma base para a reprodução do capital, principalmente o capital imobiliário e o financeiro; e a linha que busca um planejamento e uma regulação urbana que almeja a realização de uma justiça sócio-habitacional, e ambiental nas cidades, com vistas à efetivação de direitos”, diferenciou Nakano, lembrando que no ordenamento jurídico brasileiro todo e qualquer Plano Diretor e as legislações urbanas têm como obrigação orientar o desenvolvimento para o cumprimento da função social da cidade e das propriedades urbanas. “Essa é nossa referência básica para avaliar se esses instrumentos estão de fato cumprindo esse objetivo”, ressaltou, avaliando que o substitutivo do Plano Diretor prioriza a primeira linha de planejamento urbana, voltada ao interesse de reprodução do capital por meio da potencialização de negócios imobiliários.

Sônia Maria Correia Alves, representante do Sindicato dos Servidores da Câmara Municipal e do Município de São Paulo (Sindilex), chamou a atenção para o fato de que há décadas adotam-se políticas urbanas que jogam a população mais pobre para as áreas periféricas da cidade, desprovidas de infraestrutura urbana. “Será que essa revisão vem para alterar essa situação?”, questionou, acrescentando que, ao que parece, a revisão do Plano Diretor aprofunda essa condição.

Ao final das intervenções o público pode fazer questionamento aos palestrantes.

Assista à íntegra do workshop aqui: